Saturday, December 20, 2008

Pagando de cupido

Sabe aquilo que você sempre tenta ser, mas é sempre um fracasso? Sempre tem alguma coisa. A minha irmã, por exemplo, tenta ser cozinheira (e que ela não leia isso, porque mesmo sendo um fracasso, eu gosto de comer o que ela faz). E eu tento ser cupido. É que adoro quando olho pra carinha de uma amiga minha triste, desesperada, desiludida e vejo toda essa expressão ir embora quando lhes apresento um homem. O problema é que vem sempre uma expressão posterior. De uma hora pra outra, as caras mudam. E podem variar: de tristeza, de dor, de nojo ou de ódio. E, na maioria das vezes, o ódio é por mim.
Só que dois fracassos em menos de um mês eu não aceito! Ah, não aceito!
Bem, vamos às histórias:

*os nomes foram trocados, óbvio. Porque, caso contrário, o ódio de que falei, ia aumentar. E chega de confusão.

Primeiro caso:

A Xaiene: Estudante de nutrição, separada, um lindo filhinho de quase 2 anos. E tudo isso com apenas 19!

O Maurício: Estudante de engenharia na UnB, há pouco tempo solteiro, também com um lindo filhinho de 4 anos. Completou 20 primaveras em outubro.

Na minha cabeça: Maurício conhece Xaiene pelo MSN. Eles marcam um encontro, seus filhos os acompanham. Eles percebem o quanto as crianças se dão bem. Marcam uma viagem. É o primeiro passo para o que viria em poucos meses: o noivado. As famílias se conhecem e eu choro de emoção ao ver os dois juntos. Cada olhar que trocam é cheio de cumplicidade, amor, ternura, identificação. O casamento não tarda. Tudo são rios de flores e a vida segue assim. Por minha causa.


A realidade: Maurício, por uma péssima coincidência do destino, havia recém-terminado um namoro com a PRIMA de Xaiene, que, muito assustada ao reconhecê-lo em seu primeiro encontro com o rapaz, fica meio acanhada para prosseguir com a história. O mesmo se deu por parte de Maurício. Eles se beijam e blá blá blá, mas dá tudo errado. A prima descobre, o casal mal se fala e um belo dia vão a uma festa na qual Xaiene, tendo desistido do romance que criei, beija um terceiro, deixando Maurício puto da cara. Culpa dela? Culpa dele? Culpa minha.


Segundo caso:

A vizinha: Formada em educação física, sempre animada, gosta de barzinhos e Vítor e Léo. Não tem filhos, mas tem um ex-namorado que não sai de sua cabeça.

O Sr. Certinho: Amigo de meu irmão, com futuro profissional promissor como administrador, admirado por todos pelo seu bom coração. Há um ano ou mais solteiro, mas nunca sozinho. Para mim, tudo o que lhe faltava era uma namorada...como a vizinha!

O Sr. Errado: Amigo de meu irmão, amigo do Sr. Certinho. Nunca com namorada, nunca sozinho. Nunca com uma mulher apenas. Às vezes, com duas no mesmo local e na mesma hora. O que não deixa de ser uma habilidade. Excelentíssimo músico. Por fim, tudo o que a vizinha não precisava.

Na minha cabeça: O Sr. Certinho, como cavalheiro que é, manda flores pra vizinha, após tê-la conhecido em minha residência. Leva a garota para um restaurante caro e eles conversam por horas e horas. Parece que se conhecem há séculos. Em suas cabeças, pensam em me agradecer por tê-los apresentado. O tempo passa e eles nem percebem. Trocam a comida que pediram e a vizinha se encontra colocando pedaços de sua sobremesa na boca do Sr. Certinho, que,completamente apaixonado, pensa em como será o próximo encontro e no que fará para torná-lo inesquecível para a moça.


A realidade: Vocês devem ter notado que eu não mencionei o Sr. Errado na Soap-Opera. É que na minha fantasia ele realmente não aparecia, mas a realidade nunca corresponde ao que eu sonho. A verdade é que, quando a vizinha conheceu o Sr. Certinho, o outro estava também em minha casa. Todos conversaram e se deram super bem. Mas o interesse nasceu com maior intensidade a partir deste último. O rapaz disse então ao meu irmão –que, por sua vez, me disse- que estava disposto a mudar seu jeito e queria a vizinha pra ele, por toda a eternidade (tá, estou novamente fantasiando. Mas ele a queria mesmo por muito tempo). Há muito tempo vinha procurando uma namorada séria e não queria mais casos banais. Descobriu milhões de interesses em comum com vizinha, mas acabou chateado quando a viu beijando o Sr. Certinho que, em breve partirá para Salvador, para curtir o carnaval sem a vizinha. Não preciso contar o resto, certo?


Enfim, isso não foi nada. No meu histórico como cupido tenho ainda muitos chutes na bunda, términos catastróficos e uma ou outra traição. Mas eu faço tudo com boa intenção, acreditem! Mas fiquem tranqüilos, me cansei! A partir de agora, quando eu vir uma carinha de amiga triste, desesperada ou desiludida, vou sorrir com toda a empatia e compaixão do mundo e distribuir VIBRADORES. E chega de confusão!

Wednesday, April 16, 2008


Na simpatectomia...
-Você é o anestesista?
-Sim, e você é a recomendadíssima Manuela! O amigo Marcelo (anestesista também) do seu pai disse pra eu ter total cuidado sobre você - e foi me furando pra colocar o soro.
-ESPERA! Vamos conversar!!!Não estou preparada ainda.
-Relaxa, moça, isso é só o soro. Gente! Suas mãos estão pingando de suor!
-Claro, né? -na minha cabeça passou um "o que acha que estou fazendo aqui? Esperando pra ter um filho?".
-Agora vamos pôr isso daqui e...
-Nãoooo! Espera, a gente nem se conhece! Você sabe meu nome, mas eu já esqueci o seu e não sabemos mais nada um sobre o outro! Como já quer que eu durma assim? Além do mais, pensei que a anestesia fosse inalada e....
...POFT. Dormi.
Em dois segundos (na minha cabeça, claro, pois se passaram algumas horas), acordei. Pra mim, tinha acordado no meio da operação. Completamente grog, vi um rapaz chegando e sendo colocado na maca ao meu lado. Falava sem parar.
-Oi, menina! Qual seu nome?
-Manuela. E o seu?
-Daniel.
-Você também tinha hiperidrose?
-Tinha. Fiz a simpatectomia agora.
-Você também está morrendo de fome, ô...como é seu nome mesmo?
-Daniel. Tô sim. Você quer jantar China in Box no meu apartamento?
-Quero! Tô com muita fome. Não servem isso no meu - na minha cabeça drogada, ele tava numa suíte presidencial e eu, pobre, devia ter ficado numa mais econômica.
-Então, tá..Como é seu nome mesmo?
-Manuela. Você tem quantos anos?
-25, e você?
-Não posso dizer- (?)
-Uns 30?
-Acho que sim - (??).

A mãe dele chega. As enfermeiras não paravam de rir da nossa conversa doida.
-Quem é sua amiga, filho?
-É sua nora, mãe. Ela vai ser minha esposa.
-É, sogrona. hehehe.
-Então vou pegar o telefone dela pra você, filho. Se ela estiver solteira, claro.
-Eu tô sempre solteira.- (???)

Dei o telefone. Não sei se acertei os múmeros, mas foi assim.
Quando eu saía da sala, ele me deu um "Não se vá! Tchau, meu amor. Ei, qual é mesmo seu noooome?". As enfermeiras acharam lindo! Diziam que ele era gatíssimo e que eu também era bonita. Insistiam que daríamos muito certo.
Infelizmente, no outro dia, ele foi embora antes de mim. Não o vi mais, mas fico segura de que ele tenha meu telefone.
Se sentir saudade da esposa ou sair pra um restaurante chinês ele vai me ligar...Tenho Certeza...

Friday, April 04, 2008

Names, Names, Names


Toda mulher, desde o dia de seu nascimento, aprende que é preciso decorar nomes. Primeiro, o próprio, claro. Claro que a dificuldade varia entre um Maria e um Cleidisleine, mas é assim que começa. Depois vem os apelidos das bonecas, as mil coisas que se aprende na escola e a rua onde mora. Mas é quando a juventude chega que a coisa complica de verdade. A mulher adquire uma necessidade cada vez maior de decorar nomes. Caso contrário, uma fofoca pode ser comprometida. O pior de tudo é que ainda temos de decorar por nós e pelos homens. Decoramos as nossas datas importantes e, muitas vezes, também as deles, somente para lembrá-los.
Eu nunca fui boa nessa tarefa. Mesmo quando era criança, uma mesma boneca minha poderia mudar de nome por mais de 10 vezes. Nunca gravei o nome de todos os Backstreet Boys e de todas as Chiquititas.
Da minha infância pra cá, apesar de diferentes, as tarefas não se descomplicaram. Não decoro nunca a data do aniversário dos meus namoros. Às vezes, até o mesmo da minha irmã gêmea me foge da memória. Tá, tem um pingo de exagero nisso, mas é por aí o raciocínio. E as cores, então? Pra mim, existem só aquelas que aprendi aos 3 de idade. Vermelho, azul, amarelo, roxo, verde, marrom e assim vai...A diferença se dá somente em serem claros ou escuros. Mas as pessoas tem de complicar até isso com nomes como verde abacate, verde abacate maduro, verde acabate podre, podrinho, podrão...
Esses dias, resolvi decorar os nomes dos esmaltes de unha. Cheguei toda orgulhosa pra manicure dizendo:
- Vou querer passar um "renna".
-Um 'renda' que você quis dizer?
-É...Passa qualquer um.
Que frustração. Vou tentar decorar os nomes dos tecidos agora. Já decorei alguns: seda, linho, lycra. Já tô me vendo na loja de panos.
-Moça, me vê dois metros de "renna"?
-Uma 'renda' você quis dizer?
-É!!! Me dá qualquer coisa aí...

Monday, March 17, 2008

Quem ama não trai.


Quando abri o portão, foi o primeiro que vi. Como se tivesse esperado o dia inteiro por este momento morrendo de saudades, me encheu de beijos. Ele é grande, é verdade, mas nosso abraço sempre se encaixa perfeitamente. Agora só se ocupava de mim e de nada mais. Deixou tudo o que fazia de importante (ou não) para me receber com toda a alegria do mundo. Eu estava imunda, acabara de voltar de um futebol, mas nem meu suor o impediu de continuar com seus carinhos. Eram recíprocos, claro, mas eu sabia o que estava fazendo. Chamei-o, com jeitinho, para caminhar. Andamos, mas só ele estava inquieto. Estava feliz na companhia de quem amava. Eu também estava, mas sabia que aquilo não iria acabar bem e que caminhávamos em direção a sua casa. Ele não notava, só curtia o momento. Paramos em frente ao seu portão. Então, ele entendeu. Entendeu que os carinhos que eu fazia tinham um propósito. A reciprocidade não era à toa. Não falou nada. Emudeceu totalmente. Não chorava, não gemia. Só ficou quieto. Virou uma estátua de pedra completamente irremovível. Não queria entrar, estava chocado, decepcionado, tristíssimo. Traí sua confiança de modo frio, seco. Me senti Escariotes. Se lhe desse um beijo, logo depois, teria de me enforcar.
Com muito esforço, puxei-o pela coleira pra dentro de sua casa. Seu rosto divididinho pelas grades parecia querer se debulhar em lágrimas. Suas orelhas se abaixaram, mas não fazia som algum. O que mais me incomodava era olhar para aquele monte de pêlos negros tristes. Na mesma hora, entendi o que seus olhinhos, que nada mudaram desde que era um filhote, queriam dizer: "É nisso o que dá ser o melhor amigo do homem."

Monday, March 03, 2008

E no concurso público...


Vai ver as pessoas tinham toda a razão: passar num concurso de pouquíssimas vagas e que garante um salário muito bom para o resto de suas vidas requer muita, MUITA preocupação. E nem foi só pelo fato de apenas eu não possuir esse sintoma que me fez chegar à conclusão de que não passaria, foi exatamente no começo da prova, na parte de "Conhecimentos Complementares"que notei tal coisa porque eu não saberia julgar C ou E o trecho "Se a 1 Turma do TJDFT, ao analisar habeas corpus impetrado em favor de paciente preso, decidir conceder a medida, a exeqüibilidade da decisão dependerá da elaboração do acórdão". É que fiquei na dúvida se era português tudo aquilo que estava escrito. Mas enfim, depois disso, resolvi esquecer aquilo e começar um profundo estudo antropológico sobre o comportamento dos concurseiros. Os observei atentamente, percebendo os tiques nervosos de alguns, a obsessão em se olhar o relógio de outros e a intensa concentração da maioria, que nem parecia estar ouvindo a irritante tosse de uma candidata que se sentava ao fundo. Também havia os que pediam para ir ao banheiro e voltavam tão rápido que eu chegava a imaginar se haviam se esquecido de lavar as mãos. Ou, pelo menos, se lavar as mãos foi só o que conseguiram fazer com tão poucos segundos. E o tempo corria e, a cada minuto que se passava, acontecia algo extremamente grandioso como uma pequena borboleta entrar na sala ou o carro da pamonha passar anunciando o preço do milho cozido e meu Deus, como estava barato! Mas, óbvio que só eu percebia essas coisas. Eles estavam ocupados demais pensando nos Regimentos Internos, na Lei 9.784/1999, nessas bobagens do dia-a-dia.
Mas eis que eu encontrei a matemática na prova! Foi como encontrar um chocolate perdido dentro de sua bolsa em um dia de abstinência de doce. Depois de um ano sem números, eu finalmente resolveria equações de segundo grau, problemas de lógica e juros compostos! Como é linda a matemática financeira! Agora eu entendia o resto dos candidatos e já não ouvia nada, nem mesmo continuava a sentir o pé da moça que se sentava atrás de mim batendo na minha cadeira com uma freqüência imutável. Quando me dei conta, eu havia preenchido 80 dos 120 itens e já começava a ficar preocupada com o tempo, pois faltavam apenas 30 minutos para o término e eu ainda deveria começar a chutar o resto das questões de direito. E muitas emendas, leis e exeqüibilidades (tá, ainda não sei o que é isso) depois, a prova se acabou. Eu ainda estava morrendo de rir com meus chutes e raciocínios ridículos (causando, claro, um estranhamento por parte dos vigias por ser a única candidata que ria) quando anunciaram que a recolheriam. Entreguei meus papéis, triste por ter de ir embora daquele lugar tão divertido. Foram quatro horas e meia de pura alegria. Eu sabia que muitos tentam concursos por anos e anos, mas não entendia o porquê. Definitivamente, agora o sei. Mas, falando nisso, quando é o próximo concurso mesmo? Tô brincando, minha gente! Tô brincando!

Friday, January 11, 2008

O Favor

Estava ficando velho, sabia que não lhe restaria muito tempo. Aquilo era muito importante, não conseguia ver sua vida se acabar sem ver algo tão grande se perder para sempre. Pensar nisso doía ainda mais seu coração, que pulsava agora preguiçoso, enferrujado, esperando a hora certa para parar totalmente. E a hora certa não chegaria até que decidisse o que fazer. Se lembrou de seu grande amigo, talvez o melhor que já tivera em toda a vida. Se conheceram moleques e, desde então, apesar de casamentos, descasamentos, brigas e filhos, não se distanciaram e puderam manter uma bela amizade, baseada na confiança e em segredos compartilhados. Mas esse era um segredo maior. Não sabia se o pior era a humilhação de ter de contar a difícil missão que deveria realizar e que estava chegando ao fim da vida e não conseguira fazê-lo, tendo de assumir que precisaria do amigo para concluir tal coisa ou se era morrer na desonra de não tê-la concluído. Convidou-o para um chope. O amigo, como sempre o fez em todos esses anos, se atrasou por mais de uma hora. Chegou correndo, se preocupava demais com a saúde do outro, se sentindo culpado por tê-lo feito esperar.



- Como vai, Zé? Como tá o coração?

- Vai bem. Nenhuma desilusão amorosa ultimamente desde a separação- fazia uma piadinha. Queria mudar o assunto, não havia tempo pra falar de sua doença. - Tiago, preciso da sua ajuda. Tenho guardado um segredo há anos. Preciso que me faça um grande favor. É o seguinte...


E cochichou no ouvido do amigo que o ouvia com uma cara que qualquer um que a observasse, diria estar ele sendo ameaçado de morte, ou, no mínimo, ouvindo uma piada de muito mau-gosto. A cada pausa do que o primeiro dizia, Tiago fazia apenas um sinal de que concordava com a cabeça, preservando sempre os olhos arregalados e a expressão aterrorizada. Saíram de lá calados, apenas se abraçaram e tomaram os sentidos diferentes em direção aos seus respectivos carros.
O Zé chegou em casa. Como sempre, trocou sua roupa por uma que lhe deixasse mais à vontade. Se deitou na poltrona mais confortável. Aliás, finalmente ela lhe parecia realmente de grande conforto, pois só se sentara nela antes pra pensar naquilo que tanto lhe preocupava e que transferira ao amigo. Finalmente se livrara da ansiedade, dos calafrios, do estresse que o dever lhe causava. Suas nádegas sentiam aquela poltrona como se fosse a primeira vez. E não foram só as nádegas; seu coração, como um sistema de engrenagens, aliviado, resolveu descansar interrompendo todo o trabalho de seu corpo. O descanso foi fatal e Zé pôde então ir em paz.
Tiago soube da morte do Zé no dia seguinte. Claro que ficou abalado, mas havia algo maior que não apenas o abalava como o aterrorizava e arrepiava até o último cabelo do nariz. Era como se estivesse na mente de seu amigo pouco antes de seu falecimento, pois sabia exatamente o alívio que devia ser morrer e se livrar de uma tarefa como aquela. Não conseguia mais dormir e, quando o fazia, acordava suado e tremendo. Levantava, tomava um copo d'água, mas não tinha mais sono. Via o sol nascer pensando, planejando, esquematizando passo a passo o que faria.
Aquilo tomou conta de tudo o que ele era. Largou sua namorada, pois o estresse, como todos sabem, acaba com qualquer relação, mesmo aquelas mais "Sandy & Junior" possíveis. Começou a beber com freqüência, aquilo parecia ajudá-lo a esquecer no início, mas sempre se dava conta de que, após algum tempo e umas doses a mais, a bebida o fazia ficar mais sensível com tudo o que estava passando e ele se pegava por diversas vezes chorando feito uma criança e "por que eu, merda! Maldito Zé!".
Em um belo dia, anotou em um pequeno papel o grande favor que Zé havia lhe pedido, para que, caso sua fraqueza o impedisse de realizar algo de tão grandes dimensões, alguém pudesse ler o que ali havia registrado e pudesse se incumbir da tarefa. Parecia ter adivinhado o que o destino lhe preparara. Acabou morrendo de acidente de carro, tendo sido atropelado por culpa de sua distração, causada não dessa vez pela preocupação usual, mas por estar atrasado para ir trabalhar mesmo (como eu havia dito, ele nunca fora muito pontual) e não ter se preocupado em olhar para os dois lados da rua. Quando do acidente, os bombeiros não chegaram a tempo. Procuraram apenas alguma coisa que identificasse aquele senhor coberto por uma lona preta. Encontraram sua carteira,e, dentro dela, aquele papel importante com o grande favor escrito em letras manuscritas e bem legíveis, todo dobrado. Na borda, havia escrito apenas "Caso algo aconteça comigo, leia este papel, mas não diga, EM HIPÓTESE ALGUMA, a ninguém o que está escrito ali. Tome como sua vida. Obrigada, o falecido".
O bombeiro Carlos abriu o papel. Leu-o em silêncio. Ao terminar, soltou apenas uma exclamação. Algo escrito ali parecia tê-lo assustado muito mais do que o fez o acidente de carro que matou o dono do bilhete ou todos os acidentes que havia presenciado até este dia. Sabia que sua rotina ia mudar, havia agora uma preocupação que tiraria seu sono, era mais do que um dever, aquela missão estaria agora presente nos seus dias e dela seria feita toda a sua vida. E, de olhos arregalados, apenas tomou o caminho de casa, conformado com o que o aguardava e com a certeza de que não podia falhar.

Thursday, January 10, 2008

Tempo di sognare un po'...

A minha paixão pela Itália era algo tênue, novo, incipiente, até o dia em que descobri que há uma possibilidade enorme que eu vá, ao menos uma vez na vida, matar a minha vontade de conhecer um outro país. Depois de tentativas frustradas de ir pra Disney, Bariloche e Inglaterra, agora, tenho um certo poder maior de decidir e de me tornar acessível esse tipo de viagem. Isso porque, antes, era o dinheiro dos meus pais que falava mais alto, ou melhor, mais baixo, e me escapava das mãos todos os sonhos com o esqui, o Big-Ben e o Mickey. Agora, descobri que posso fazer um intercâmbio pela Universidade, sendo necessário quase somente o meu esforço e um grande IRA (índice de rendimento acadêmico).
Eu, portanto, sabendo mais ou menos disso, passei o semestre inteiro preocupada com minhas menções, visando sempre ao sonho de mangiare una pizza in Italia!
Mas, esses dias, toda a minha ânsia de ir à Itália tem se tornado uma obsessão! Eu durmo pensando nisso e acordo assustada, pois meu vizinho na Itália tentou me matar em meus sonhos. Eu almoço imaginando que, em breve, estarei me enchendo de massas neste mesmo horário, na península tão distante. Escovo os dentes e imagino como serão as pastas de dente por lá. "E como se chama 'pasta de dente'? 'Pasta' é 'massa' por ali, preciso urgentemente saber disso. Falando nisso, preciso perguntar, o mais rápido possível, à minha professora como se diz 'absorvente' em italiano. Meu Deus, é impossível que eu fique seis meses por lá e não precise de um desses. Tá, é biologicamente possível, mas pra mim, é impensável. Devo, ainda, saber como se diz 'quanto é a escovinha? E quanto é o pé e a mão? Dá pra fazer uma francesinha?'. Amanhã vou atrás de saber isso".
E assim, nem mesmo o fim da pasta e o desgaste dos meus dentes são suficientes pra me fazerem parar com esses pensamentos.
Durante o dia, vou listando o que eu tenho de fazer para realizar meu sonho: manter o IRA alto; ter atividades extra-curriculares, pois elas vão contar muito na seleção dos alunos pro intercâmbio; estudar, pelo menos, 20 palavras novas por semana; aprender a comer de boca fechada.
E junto de tudo isso, começo a pensar em como tudo vai acontecer, desde o dia em que eu puser os meus pés no aeroporto italiano. Penso nos meus vizinhos, na melhor amiga que eu vou fazer por lá, nas festas, nas danças. Me vejo ensinando o samba (mesmo sem saber de modo algum sambar) aos meus novos amigos e me vejo discutindo futebol com os tetra-campeões, só porque, quando no exterior, o Brasil é o melhor país do mundo e só dá motivo pra orgulho.
E, quando penso no namorado que não tenho aqui, lembro (olhe bem, LEMBRO) do meu gato, o homem da minha vida que me beija loucamente e sussurra no meu ouvido um "sei bellissima, amore mio. Sei soltanto mia. Non posso pensare di non averti accanto". E daí, penso na despedida, na minha volta ao Brasil, nos olhos do meu amor marejados de lágrimas, a minha melhor amiga pedindo pra que eu a telefone todos os dias, meu vizinho, que depois de um tempo resolveu virar meu amigo deixando seu preconceito por latino-americanos de lado, e todas aquelas pessoas especiais que conheci nesses 6 meses maravilhosos. E, dias depois (na minha imaginação, claro), me vejo no Brasil de novo, na hora do almoço, comendo meu bom e tradicional prato feito de arroz, feijão e bife. Me vejo escovando os dentes, como o faço agora e descrevi anteriormente. Mas, mais do que isso, já me vejo sonhando em quando, como e o que farei para poder rever mais uma vez la mia meravigliosa Italia que tão boas lembranças me deixou...

Wednesday, January 02, 2008



Reflexões de ano novo


Faltavam alguns minutos para a meia-noite e, como de costume, fazíamos a nossa oração em família. Foi quando minha mãe resolveu inovar; pegou uma almofada no sofá e iniciou a explicação do que seria feito com aquilo. Segundo ela, teríamos, cada um, de pegar o objeto e imaginá-lo como sendo o ano que se passou, e transferir a ele todo o nosso sentimento em relação aos fatos que deixávamos para trás. Valia de tudo: carinhos, porradas, cuspe, beijinhos, qualquer coisa! Começamos então a tal dinâmica. Não demorou para chegar a minha vez; logo que segurei a almofada, pensei em tudo que havia me acontecido no ano de 2007. Reprovações no vestibular, uma decepção cá, outra decepção acolá, não hesitei e tratei-a com a maior indiferença possível, tornando evidente o desgosto que senti pelo ano do qual me despedia com um aparente alívio. Terminada a brincadeira, começamos a rezar, fosse em voz alta, fosse cada um fazendo para si sua própria retrospectiva. Voltei a pensar no ano passado. Reprovações, eu as tive, mas com o grande mérito de ter passado extremamente perto da aprovação. Tive também decepções simples, nada muito grave que me trouxesse intensa infelicidade.E comecei a me lembrar de minha família, de como o ano foi lindo! As bodas de prata de meus pais, todos que eu amo com saúde, o carinho intenso e amor incomensurável que temos uns pelos outros, o apoio que todos me deram no que costumo chamar de "fracassos acadêmicos". E meus amigos, então! Velhas amizades se fortalecendo, novas amizades surgindo, amizades perdidas sendo RECUPERADAS! E fazer 18 anos, imagine, não tem preço! Foram tempos de muita dança, muita festa, muito estudo, muita felicidade! Não foi, definitivamente, um ano ruim, muito pelo contrário! Ganhei maturidade para persistir nos meus ideais, experiência em determinados assuntos pessoais e muitas pequenas alegrias!!!.. É, terminamos a oração, o jantar, brincamos bastante e todos foram dormir. Menos eu. Havia ainda algo que eu precisava muito fazer. E assim, quando todos já dormiam tranquilos, peguei a almofada que outrora desprezei e dei-lhe um grande beijo, mas um beijo com todo o sentimento de gratidão que existia no meu coração...